KEITA MAYANDA, NKRUMA SANTOS E DJ NKAPPA: A INFLUÊNCIA NEGATIVA E POSITIVA DAS LETRAS (OPINIÃO)

Tem se afirmado que as músicas mais ouvidas e dos artistas populares influenciam positiva e negativamente no comportamento das pessoas, para  sustentar essa conversa, certa vez um programa da Rádio Luanda chamou atenção e responsabilizou os artistas que estão actualmente no top sobre o comportamento negativos dos seus fãs; Sendo verdade ou procurando analisar a questão, levamos o tema a consideração de alguns envolvidos directamente na cultura hip hop, é desta forma que Keita Mayanda, Dj Nkappa e NKruma Santos, pessoas que já têm considerados quilómetros de rap percorridos, deram a sua opinião.
Perguntamos o seguinte:
1 – Como caracteriza as letras das músicas mais populares no rap feito actualmente?
2 – Até que ponto o rap feito hoje influência NEGATIVAMENTEno comportamento das pessoas.
3 –  Até que ponto o rap feito hoje influência POSITIVAMENTE no comportamento das pessoas.
4 – Que comparação faz ao que se escrevia antes e hoje e como as pessoas reagiam ao que ouviam?
5 – A que conclusão chegou? a) o rap feito hoje, recomenda-se? B) Para melhorar qual seria a na sua opinião a solução?

KEITA MAYANDA:
Rap em Angola “existe uma limitação temática,”

1º eu não oiço música popular, mainstream ou comercial e não é por razões ideológicas, simplesmente não gosto, nunca gostei e não vou gostar. Quando digo não oiço é: não tenho sequer curiosidade em saber porquê certa música está tão popular, ou sobre o que fala ou falam os artistas mais populares hoje, suponho que seja sobre festas, rabos, jantes, noitadas, as bitches, a riqueza aparente.
2º Essa não é uma pergunta com resposta fácil. Eu não creio que uma música possa levar a um comportamento considerado negativo ou condenável, per se, creio que precisa haver uma disposição do ouvinte para agir de forma condenável, dizer que o rap de hoje em dia influencia negativamente o comportamento da juventude é colocar em cima do rapper a total responsabilidade pelo comportamento dos ouvintes e isso não é verdade. Vejo no facebook muita gente a usar o NGA como exemplo de má influência através da música e tenho dúvida de que alguém consiga provar que existe uma relação directa entre ouvir NGA e o aumento do consumo de álcool, tabaco ou liamba. É preciso perguntar porquê é que entre os fãs do NGA existem pessoas que não bebem, fumam ou sonham com a Pérola? porque cada um é responsável último pelo seu próprio comportamento, o NGA e a sua música não são um psicoactivo para alterar o julgamento dos ouvintes, tão importante quando os temas que ele trata é a maturidade e o bom senso de quem o escuta.
3º Tal como no caso da má influência creio que um rap influenciar positivamente depende também da disposição do ouvinte para agir pelo bem. O rap é antes de tudo entretenimento, pode ser usado para educar ou para elevar a consciência das pessoas, mas mesmo quando ouvimos uma música que nos exorta para o bem, somos nós a decidir se faremos o bem. O que eu percebo quando se usa o termo influenciar as pessoas querem dizer que vai necessariamente levar o ouvinte a agir de uma determinada maneira e isso não é verdade. Muitos ouvintes gostam de ouvir rap consciente, mas sobretudo porque lhes soa melhor ouvir uma mensagem positiva do que outra, portanto acabam por se entreter a ouvir alguma coisa inteligente, é comparável a ler um bom livro e desfrutar do prazer que a leitura proporciona.
4º A escrita do rap em Angola, fundamentalmente, não se alterou muito apenas se fragmentou, quero dizer surgiram indivíduos com habilidades mais variadas, mas de certa forma existe uma limitação temática, uma falta de domínio de temáticas mais complexas. Nos anos 90 por causa da escassez de novidades as pessoas reagiam às músicas com muito mais agrado, quase religiosamente, hoje é fácil lançar músicas em formato de cd, aos quais chamam álbum ou mixtape e o cuidado com as letras não é o mesmo, porque um indivíduo sem muito treino na escrita que se vê compelido a escrever 15 letras acaba por despachar uma boa parte delas, ou falar sobre assuntos que não domina, ou a orientar mal os temas.
5º Existe hoje bom e mau rap, sempre existiu e sempre existirá, mesmo durante o período conhecido como The Golden Era (da segunda metade dos anos 80 à primeira metade dos anos 90) havia mau rap, muita gente saudosista gosta de dizer que hoje em dia não se faz bom rap, muita gente incluindo rappers, que dessa forma estão a passar um atestado de incompetência a eles mesmos, é melhor desistirem talvez sejam vocês a impedir que o bom rap seja ouvido.
Nkruman Santos:
“O comportamento das pessoas hoje é que influência negativamente as músicas que ouvimos”
1- Normais. Representam muito daquilo que as pessoas que ouvem fazem no seu quotidiano.
2- Acho que é ao contrário.  O comportamento das pessoas hoje é que influencia negativamente as músicas que ouvimos
3 – Acho que influencia pouco. Acho que poderia ser mais positiva, trazendo outros pontos de vista, diferentes daqueles que a juventude vive – numa perspectiva evolutiva. Entendo que música pode trazer alternativa, uma visão de causa e efeito para que possa também contribuir positivamente.  Mas não é o que vemos hoje.
4- Acho que antes havia uma maior preocupação social nos temas. Mesmo o “amor” era cantado com mais densidade. Existem no presente artistas com qualidade musical igual ou superior aos de outrora. Mas a riqueza musical penso não ser a mesma.
5- A música reflecte exactamente o grosso da sociedade que temos. Para mudar a música teríamos que mudar a mentalidade das pessoas. Fazê-las desenvolver gostos alternativos. Por outro lado, os media (oficiais e sociais) poderiam desenvolver campanhas de publicitação de músicas diferentes mas não se lhes pode obrigar à nada. Só o tempo dirá.
Dj Nkappa:
O problema está naquilo que se promove e se consome
1ª – Penso que nunca devemos pensar que uma coisa esta mal, quando só vemos um lado da coisa. Eu penso que as letras das músicas feitas hoje, na maioria dos casos, só se adapta a realidade de hoje. Tal como ontem, hoje ouvimos muita música cuja letra retrata uma realidade absurdamente fictícia a realidade do artista, mas isso não é novo por cá, já vimos isso noutros tempos também. Na maior parte dos casos, isso vem de artistas que não são autênticos. Isso não vem dum Kennedy Ribeiro, dum Dabullz, não vem dum Das Primeiro, vem de artistas que andam nisso por ondas e porque podem também fazer isso, pois isso não contem contra indicação. Mas isso não tá mal como se advinha, afinal os artistas autênticos ainda estão ai e a fazer o que sempre fizeram, inovando sem sequer perder o foco da cena. Há ainda na cena, Artistas com uma notoriedade relativamente nova e a fazer muito boa coisa. Sanguinário e Mono Stereo são prova disso, Kallisto, Sombra etc. Eu penso que o problema está naquilo que se promove e se consome
2ª – Infelizmente, o Discurso da música que se promove chega aos ouvintes da forma menos esclarecida e cria essa confusão no pensamento dos mais Jovens. Eu acredito que essa música não influencia alguém na casa dos 30 anos, como diz o meu amigo Edivaldo Dos Santos. Os músicos, pelo menos por cá nunca ouvi, alguém dizer que fumar ou Beber é muito bom, oiço outro tipo de discurso baseado nessa conversa, mas nunca essa apologia de que é bom.
Cabe as pessoas saberem filtrar aquilo que ouvem. Cabe os Medias filtrarem aquilo que promovem aos mais Jovens, Cabe aos Activistas Sociais saberem se pronunciar com relação a essa música.
 
3ª – O Rap toca as pessoas de uma maneira diferente com relação as outras músicas. Nós, desde muito cedo aprendemos que o Rap é música de intervenção social e que os Rappers são Professores, dai que ao ouvir um Rap, Um Leigo começa por prestar atenção ao discurso do Rapper e só depois viaja para os outros cantos dessa mesma música.
Logo, se o discurso for incentivador , ele também começa já a ganhar aquela consciência de que é preciso fazer, é preciso mudar e tal; se for o contrario, ele logo fica pela batida, ou começa a desdenhar a música no geral.
4ª – Continua se a escrever o que cada um quer que se oiça dele, tanto ontem, quanto hoje, eu penso que nada mudou como se diz e se pensa, mudou sim é o tipo de música que se propagou. O Rap alternativo perdeu espaço motivado por esse tal “Veto” por causa dos nomes sonantes do Rap aliados as manifestações e dai que hoje quase só se ouve o Rap do “Fictícismo”. Também penso que exageramos pedindo coisas a quem tem muito pouca experiência de vida. Nem todos são CFKappa, pra escrever maravilhosamente bem e convencer um adulto, até porque há ainda adultos nessa condição de péssimos Rappers. O problema esta mais pautado na autenticidade dos Artistas. O que o Kool Klever escrevia ontem, ainda é o que ele escreve hoje, só que hoje ele relata o hoje. O Phathar Mak, o Yannick Afroman etc.
5ª – O Rap esta bom e recomenda – se sim senhores. Só temos é que saber o que queremos ouvir. Já disse o Nga, que se não queres ouvir falar da rua, não ouves Nga. Diz o Reptile que se não gostas do meu som, é só não pôr Play.
Bem, gostaríamos que este inquérito fosse estendido a alguns rappers bem ouvidos nos dias de hoje, uma vez que está em analise a música feita actualmente, fizemos o convite a muitos artistas incluindo o Cfkappa, NGA e o Ready Neutro, infelizmente por alguma razão, as suas opiniões não chegaram a nós até ao momento em que clicamos “PUBLIQUE-SE”, no entanto, mais importante que uma conclusão deve ser a preocupação de debater-se essa questão despidos de quaisquer ideais e ideas pré-concebidas, o conceito de rap como música de intervenção social não cremos que esteja adulterado, baseada nesta visão o rap foi concebido para despertar a consciência de quem a escuta, logo se a mensagem for negativa não a como desassociar a música, mas é bem verdade também que nunca ninguém disse que fumar, beber e drogar-se é bom. Cabe a cada um de nós saber separar o certo do errado, o bom do mal e claro ter o ideal de que ser popular carrega uma responsabilidade social com os fãs.

DINO CROSS